Comecei a reler A Insustentável Leveza do Ser, de Milan Kundera, o romance entre um médico e uma fotógrafa durante a invasão de Praga pelo exército russo. Na primeira página ele fala da fugacidade da vida. "O mito do eterno retorno é uma idéia misteriosa e Nietzsche nos diz, por negação, que a vida que desaparece não mais voltará, que é semelhante a uma sombra, não tem peso. Uma vida não deve ser considerada mais importante que uma guerra entre dois povos africanos [este Milan não conseguiu esconder seu preconceito contra os negros, achou esta imagem mais forte do que dizer: dois povos na Mesopotâmia] há muitos séculos. Não alterou em nada a face do mundo apesar de trinta mil negros terem encontrado nela a morte através de indescritíveis suplícios".
Kundera tropeça em paradoxos. Sea vida e "nosso amor é fugaz", como diz a música de Marina Lima, por que se leva tão a sério um crime?
"Digamos, portanto, que a idéia do eterno retorno designa uma perspectiva na qual as coisas nos aparecem diferentes de como as conhecemos, elas retornam sem as circunstâncias atenuantes de sua fugacidade".
Mesmo em nosso cotidiano repetitivo as coisas não voltam iguaiszinhas, sempre há um detalhe que nos impede de concordar inteiramente com Chico Buarque: "todo dia ela faz tudo sempre igual".
"Como condenar o que é efêmero? As nuvens alaranjadas do crepúsculo douram todas as coisas com o encanto da nostalgia, inclusive uma guilhotina [ele cria cada imagem!]". E, sei lá, condenando as crenças na ressurreição e na reencarnação ele diz: "Essa reconciliação com o mal, até com Hitler, trai a nossa perversão moral inerente e afirma que o mundo está fundado essencialmente sobre a inexistência do retorno, pois neste mundo tudo é perdoado".
Concorda com ele? A lembrança que me ficou da primeira leitura é de que o livro é bom, então vou virar a página e continuar a leitura.