A História tem estratos abaixo do que vemos, e eles são bastidores misteriosos.
No livro Magia e Técnica, Arte e Política, do filósofo Walter Benjamin, onde ele fala do século XIX, li (p.30):
“A característica de todas as posições burguesas é uma irremediável vinculação entre a moral idealista e a prática política”.
Ele quer dizer que no meado daquele século toda a sociedade vivia um ideal moralizante, como atualmente. Neste ambiente surgiram várias religiões, como as Testemunhas de Jeová e os Adventistas do Sétimo Dia. Mas sob aquela superfície calma agitavam-se diversas tensões que alguns intelectuais perceberam.
“O culto do mal feito por pensadores da época foi um aparelho de desinfecção contra todo diletantismo moralizante, por mais romântico que ele fosse. O surpreendente é que, sem qualquer coordenação entre si, ajustaram seus relógios para precisamente há mesma hora quarenta anos depois surgirem os escritos de Dostoievski, Rimbaud e outros, denunciando ações humanas sem nenhuma ética”.
O que ele explica é que surgiu no meio de um estado de calma aparente uma literatura que explorava a sociedade marginalizada, o crime, e os cultos ocultistas. Era o surrealismo expondo uma realidade que se pretendia desconhecer. Então, no princípio do século XX, mais ou menos neste mesmo estágio que vivemos hoje, pelo ano 1913, explodem diversas violências, como a primeira Guerra Mundial e a revolução Comunista. Milhões morrem. Benjamin, continua:
“Autores como Dostoievski compreenderam como é falsa a opinião pequeno burguesa de que o bem inspirado por Deus pode levar o homem a praticar todas as virtudes. Escreveram que o Mal é inteiramente espontâneo no ser humano. Reconheceram a infâmia como algo préformado em nós mesmos. Como algo que nos é inculcado e imposto como tarefa. Para eles Deus criou não apenas o céu e a terra, o animal e o homem, mas também a vingança, a mesquinharia e a crueldade”.
Não é? Numa sociedade cheia de religiões na qual não cessam de acontecer crimes ediondos e atentados contra crianças isto deve nos mostrar que tem mesmo algo de Mal entranhado em nós.