Voltava da escola, tinha 10 anos, quando vi um movimento no
final de minha rua e corri pra lá. Cheguei no exato momento em que uma linda
moça correndo pelo quintal da casa foi segura pelo irmão e arrastada para
dentro de casa. A cerca viva deixava a vizinhança ver aquela situação íntima e
privada. O que foi, perguntei. Uma vizinha explicou: Ela tomou formicida e
sofrendo muito corria sem ninguém conseguir pegá-la. O suicídio sempre foi para
mim um mistério que buscava entender. (trombetas amarelas)
“Por consequência, a causa das nossas dores ou das nossas
alegrias, não reside, de ordinário, na realidade presente, mas em pensamentos
abstratos; e são estes que se nos tornam frequentemente molestos até ao ponto
de nos criar tormentos a cujo confronto todas as dores dos animais são
insignificantes”.
Por causa de nossa razão, este maravilhoso mecanismo que foi
adicionado a raça dos homo, a dor física é, muitas vezes, mais suportável que o
sofrimento moral. Aquela bela moça da minha infância havia sido desprezada pelo
noivo e isto foi para ela tão insuportável que buscou a morte.
O filósofo Artur Schopenhauer continua, nos elucidando: “Pois
que tais torturas morais, às vezes, suplantam nossas dores físicas, pois que,
sob o império de sofrimentos intelectuais extremos, procuramos os sofrimentos
físicos com o único fito de distrair a nossa atenção daqueles para estes: razão
pela qual vemos o homem dominado por violenta dor moral arrancar os cabelos,
bater o peito, arranhar o rosto, rolar por terra. São meios violentos para
distrair-se dalgum pensamento tornado insuportável”.
São as dores da alma, a consciência ferida. Alguns
espiritualistas explicam que, como espíritos, temos um código de honra mais
elevado e quando enfrentamos uma situação amoral, praticando-a ou sofrendo de
outrem este dano, a dor nesta nossa porção imaterial é forte demais. Ele continua:
“É igualmente porque os sofrimentos morais, como os mais
fortes, nos tornam insensíveis aos sofrimentos físicos, que o suicídio se torna
quase fácil ao homem desesperado ou a quem se sinta dilacerado por uma tristeza
mórbida mesmo quando no estado anterior de calma física ou moral este
pensamento o tivesse feito recuar. Com razão, portanto, diz Epíteto: Não as coisas
por si mesmas turbam o homem, mas os decretos das coisas. E Sêneca,
acrescenta: Dão-se muitas coisas as quais mais do que nos oprimem, nos
espantam, e mui frequentemente somos angustiados mais pela ideia do que pela realidades”.
No livro Rebecca, que estou relendo, cita um poema sem mencionar o nome, que diz:
“Fugi-lhe, dias, noites, anos em fora
Como a fugir dos próprios pensamentos.
De olhar triste e cansado de quem chora
escondi-me. Por lágrimas, lamentos
e risadas alegres acossado.
Perseguido, atirei-me, desvairado,
nos abismos profundos, insondáveis,
onde o terror e a morte residem.
Ouvindo sempre os sons intoleráveis,
daqueles passos que me perseguem”.